Tuesday, March 21, 2006

Estátuas quentes!!

-Gostas do meu vestido?
- Gosto, essa cor condiz com os teus olhos. Cor de rosa. É feito de quê?
- De lã, caxemira e renda. Fui eu quem o fez... cozi com cabelos de várias cores. É um feitiço que me ensinaram.
- Feitiço? Para que precisas de um feitiço?
- A muitos anos ainda em pequena, uma velha muito velha leu-me nos olhos, que um dia encontraria alguém que iria olhar para mim para lá de tamanha feiura. E que seria num lindo baile...
- E onde é esse baile?! o mensageiro não apregoou baile algum...
Mas continuou a cantarolar... como se a irmã não existisse sequer...
- Vou colocar o cabelo no alto nuca, disfarçará decerto a esta minha feiura, colocarei pólen de flor "marron" na pele para parecer mais rosada e nos lábios banha com corante vermelho. Apertarei o vestido ate encolher gorduras.
- Sim (proferiu pacientemente) realmente, realça-te as curvas. Estás linda...

Aprontou-se apressadamente... a irmã pensou tratar-se de mais um devaneio. Pois desde pequena que era mole de inteligência. Alias não seria a primeira vez que ela se iludia em bailes e festivais para os quais só ela era convidada. Dizia o senhor doutor que também era veterinário, num dos últimos devaneio do qual não foi fácil trazê-la de volta, que se tratava de dores de solteira... que se curava com sangramento.

Vivia num não conseguir aprender... vivia dentro de um mundo só seu que tinha um enorme jardim... e se transformava naquilo que desejava. Desta vez passeou por dentro de arcos abobados, avenidas herbáceas e parou de frente para um corredor de calçada ladeada de sebes muito bem aparadas. Algumas estavam milimetricamente alinhadas de quatro em quatro e esculpidas em animais fantásticos.

Ao fundo desse mesmo corredor uma porta com janela... correu imediatamente antes que fosse proibido e em segundos já estava de pé junto à janela. Na humidade interior de respirações, dos vidros não conseguiu ver nada... limpou com a ponta do vestido mas era de dentro... voltou a espreitar, e sem querer com um simples toque de nariz abriu-se...

Estava a decorrer um festival de musica e cores que rodopiavam num salão luxuosamente ornamentado. Cheirava a beleza interior, verdade e sabedoria. Estranhamente estava cheio de pessoas. Pessoas bem vestidas e a rigor. Vestidas à época e a muitas outras épocas anteriores. Mas o mais interessante é que estavam todas paradas, como se de estátuas se tratassem. Estáticas em posições de segundo antes... como se algo ou alguém tivesse entrado de repente e as tivesse paralisado. Tinha pensamentos fracos para “descorrer” o que se passava. Para ela era um baile onde animadamente se confraternizava independente do indumentária... passou por entre todas, tocou-lhe e pareceu sentir. Dançou com este e aquele numa dança onde só ela se movimentava.

Ao fundo um rapaz parado em posição de convite de dança.
Encaixou as suas largas ancas nos braços estáticos do rapaz e rodopiou... apaixonou-se... pelo rapaz que não se mexia...

Por fim lutou com o cansaço... caiu na exaustão. Aconchegou-se nos braços do rapaz que não se mexia e adormeceu... estremunhou por várias vezes e pareceu-lhe ver as pessoas estátuas do baile a movimentarem-se e a rir. O rapaz sempre ao seu lado agora com os braços mornos acariciava-lhe os seus cabelos cor de laranja. Numa sonolência voltava sempre a cair no mesmo sono profundo... e repetidamente via as estátuas em posições diferentes cada vez que abria os olhos...

6 comments:

Abelhinha said...

O que importa é o que acreditamos e desejamos... o resto acontece naturalmente

amigona avó e a neta princesa said...

Gostei de ler...

poca said...

a imaginação apresenta-nos cenários magníficos...

Madame Pirulitos said...

É assim que podemos fugir da normalidade. E viver muitas vidas. Fez-me lembrar uma música que já ofereci a outra pessoa...

A waltz for a night

Kiau Liang said...

Cansa tanto esse luta, dos braços que não mexem, mas a sensação de aconchego, na inconsciência ou dormencia que as vezes é a vida, faz-nos lutar de novo ...nunca percebi bem porquê...mas faz....

inBluesY said...

sonhar faz bem, mesmo com o imposivel, aquece-nos.