Passei aquela tarde sentada na casa de paredes de vidro e telhado de lona, virada para o mar. O vento batia forte contra as vidraças e o barulho da chuva ensurdecia enquanto chicoteava a lona.
Enrosquei-me em mim própria sentada na cadeira, olhei duas vezes seguidas para o livro que estava em cima da mesa, mas não tive coragem de lhe pegar, simplesmente não me apetecia.
Lá ao fundo bem baixinho parece-me ouvir no rádio Simon and Garfunkel.. era mesmo... era Mrs. Robinson. Fechei os olhos e só os abri quando me vi sentada na parte de trás do carocha azul bebé a caminho da casa da minha avó.
Enquanto percorria aquele espaço intemporal, no peito ia sentindo as saudades que me rasgavam na passagem de um tempo absurdamente rápido.
Viajei até ao tempo da minha infância. Até à casa da minha avó, onde os dias eram tão cheios que na minha pequenez pensava que a vida não chegava.
E pensei particularmente, naquela hora sagrada, a hora em que o gira disco tocava Simon, disco atrás de disco. Chegávamos da praia, tomávamos banho num pequeno saguão, e enquanto se esperava vez, dançávamos os quatro numa loucura frenética ao som de berros e de refrães decorados de tanto ouvir.
Lembro-me de pensar que o mundo era só feito para mim e para eles, e de querer que nunca acabasse. Naquele momento não precisava de mais ninguém.
Aos poucos fui regressando à casa de paredes de vidro e telhado de lona. Agora já não se ouvia o vento nem a chuva. Ouvia-se a musica ainda mais alta, alguém tinha aumentado o som.
Na mesa do lado estava sentado um senhor com os olhos cheios de lágrimas... olhei sem querer olhar, e percebi na sua deficiência porque chorava.